quarta-feira, 9 de maio de 2012

Ensinamentos pelo tempo



"Não há terra mais dificultosa de governar que a pátria, nem há mando mais mal sofrido, nem mais mal obedecido do que o dos iguais." (Padre António Vieira, "Sermão da Dominga Vigésima Segunda")

Padre António Vieira era um homem do seu tempo e empenhado no seu tempo. É um facto inegável e uma qualquer pesquisa sobre esta figura das letras portuguesas (como por exemplo a leitura da entrada da Biblos, do grande Aníbal Pinto de Castro, sobre este autor, que nos dá uma perspetiva da sua obra e de como a sua vida está nela refletida como uma impressão digital) corrobora esta afirmação.
De facto, tenho uma admiração por homens e mulheres que, nos mais variados momentos, debaixo das mais díspares circunstâncias (estas por vezes bem adversas) excedem a sua condição humana e tornam-se maiores que eles próprios. Sentimos que provavelmente hoje não temos homens com esta fibra, o que nem sempre é verdade.
Esta frase excecional só podia ter sido pronunciada por alguém excecional. Penso não ser rebuscado afirmar que Vieira amava seu país e que esse amor à pátria lhe aguçou a verve crítica e o olhar atento sobre o seu tempo e sobre o mal da sociedade de então. E esse mal era fruto das imperfeições dos seres humanos: somos seres imperfeitos por natureza, e a sociedade, sendo uma criação humana, não podia também deixar de o ser. 
A pátria está povoada de homens que não se governam e não se deixam governar e desse mal já se queixavam os romanos aquando das invasões, dizendo que os povos que habitavam esta parcela de território nem se governava nem se deixava governar. O alcance de frases como esta do jesuíta evidenciam bem a grandeza do pensamento, mesmo que movido, por vezes, por um pragmatismo politicamente orientado (para não dizer comprometido): consegue captar aquilo que havíamos sido, aquilo que éramos e aquilo que viríamos a ser.
Vieira era jesuíta mas não era um santo, mas lê-lo é sempre um prazer, seja nas cartas ou nos sermões. Mais uma prova da sua grandeza: mesmo depois de séculos, continua a ensinar-nos.

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